É inverno, chove sem parar há três dias e Laura finalmente termina de se mudar para o novo apartamento, em um prédio antigo no centro da cidade. Recém saída da casa dos pais, ela não poderia estar mais animada com a perspectiva de independência.
Após uma festa de inauguração, ela se despede dos amigos acompanhando-os até o elevador, quando percebe a porta do apartamento vizinho ao seu ser aberta. Laura jurava que aquele apartamento estava desocupado, pois durante as semanas que passou organizando a mudança nunca notou nenhum tipo de movimentação ou barulho que indicasse a presença de uma pessoa ali. No entanto, um homem saía de dentro do aposento. Ele tinha aparência jovial, uma pele pálida como a neve e cabelos mais escuros que a noite, os quais caíam sobre o seu rosto. Ele carregava uma caixa de guitarra e passou apressado por Laura e seus amigos. Ela observava-o com curiosidade, quando seus olhares se encontraram. Dizem que ao olhar nos olhos de uma pessoa é possível enxergar sua alma, porém, para Laura, fitar aqueles olhos foi como encarar o abismo; eles eram mórbidos e fundos e carregavam consigo o peso de um grande fardo.
Mais tarde, naquela mesma noite, Laura acordou subitamente com barulhos que vinham do apartamento vizinho. Os barulhos então tornaram-se gritos, mas esses ela não conseguia distinguir se eram de prazer ou de dor.
Vários dias se passaram e Laura desenvolveu uma certa curiosidade por seu vizinho misterioso. Ela percebera que ele passa a semana trancado no apartamento e sai somente às noites de fim de semana, e ela sempre consegue ouvir os mesmos gritos e barulhos quando ele retorna. Ao perguntar para os outros moradores do prédio sobre o rapaz, não conseguia nenhum tipo de informação, a não ser de que ele se chamava Eduardo, era uma pessoa bastante reservada e que se mudara há alguns anos, mas ninguém sabe de onde.
Uma noite, quando a curiosidade de Laura já havia se transformado em um interesse pulsional, ela decide seguir Eduardo pelas ruas chuvosas da cidade. Espreitando-o por entre as esquinas, ela chega em um bar um pouco lotado. Ao perceber uma espécie de palco montado, decide esperar e ver se Eduardo irá tocar. Duas cervejas depois, ele sobe com sua guitarra, senta num banco e começa a cantar. Ao final da primeira música, ele avista Laura. “Bom, acho que tenho uma fã presente aqui hoje. Essa é especialmente pra você.”, ele diz enquanto olha fixamente nos olhos dela. Agora seu olhar é ainda mais profundo do que aquela primeira vez, ele parece penetrar as órbitas oculares de Laura, vasculhar todos os seus medos e angústias até chegar no âmago de seu ser. Ele não desvia o olhar por um segundo e ela também não consegue. As notas, de uma psicodelia melancólica, que saem da guitarra de Eduardo hipnotizam a garotar e transportam sua mente para um lugar distante dali. Ao final da canção, Laura está completamente atônita.
O show se encerra, Eduardo aproxima-se da mesa de Laura, repousa a mão sobre a dela - ela sente a Pele dele fria, como se não corresse sangue por suas veias. Ele pergunta se ela não quer acompanhá-lo de volta ao prédio. Com uma voz distante, que não soa como a sua usual, Laura responde que sim.
“Sabe, há tempos eu venho lhe observando. Decidi fazer com você algo que há décadas eu não fazia mais... você pode ver isso como um presente. Pelo menos foi assim que me contaram.”, disse Eduardo quando os dois chegaram ao andar dos apartamentos. “Mas para isso, eu quero que você se sinta em casa. Porquê não me convida para entrar?”, ele completou. “Tudo bem”, respondeu Laura. Ela abre a porta e entra em seu aparatamento, “quer entrar?”, diz. Eduardo entra e fecha a porta atrás de si. “Vá para o quarto e tire a roupa. Não queremos nada rasgado, não é?”, ele diz. Laura obedece e começa a despir-se em frente à um espelho ao lado da cama. Seus movimentos são lentos, como se o corpo demorasse a reproduzir os sinais enviados pelo cérebro. Ela então sente a pele gelada de Eduardo encostar na sua. No espelho, porém, onde deveria estar o reflexo de Eduardo há um enorme vazio. Laura vira-se e se depara com uma criatura animalesca na sua frente, de feição completamente decrépita, uma pele sem vida alguma, os olhos de um predador que se delicia com uma presa pronta para o abate. Com o susto, ela desperta do estado de sono em que estava, no entanto só é capaz de dar um grito, que irrompe pela noite, misturando-se ao barulho da chuva. É tarde demais. A boca da criatura expande, revelando quatro presas gigantes, que saltam por entre a infinidade de dentes. O monstro ataca Laura mordendo-lhe o pescoço, atira-a na cama e se joga sobre ela para sugar toda a vida que há naquele corpo. Ele só para quando não há mais nenhuma gota de sangue correndo por entre as veias e artérias.
A criatura rola para o lado e aos poucos transforma-se novamente em “Eduardo”. O corpo de Laura permanece deitado, decrépito, sem vida e sem cor, quando de repente, seus olhos se abrem. Mas não são mais os mesmos olhos, eles não têm mais nenhuma vitalidade, encaram o nada com a mesma morbidez e profundidade que os de Eduardo.
Ao dar-se conta de sua situação, Laura chora um choro sem lágrimas, que a acompanhará, como um pranto silencioso, por toda a eternidade.
Após uma festa de inauguração, ela se despede dos amigos acompanhando-os até o elevador, quando percebe a porta do apartamento vizinho ao seu ser aberta. Laura jurava que aquele apartamento estava desocupado, pois durante as semanas que passou organizando a mudança nunca notou nenhum tipo de movimentação ou barulho que indicasse a presença de uma pessoa ali. No entanto, um homem saía de dentro do aposento. Ele tinha aparência jovial, uma pele pálida como a neve e cabelos mais escuros que a noite, os quais caíam sobre o seu rosto. Ele carregava uma caixa de guitarra e passou apressado por Laura e seus amigos. Ela observava-o com curiosidade, quando seus olhares se encontraram. Dizem que ao olhar nos olhos de uma pessoa é possível enxergar sua alma, porém, para Laura, fitar aqueles olhos foi como encarar o abismo; eles eram mórbidos e fundos e carregavam consigo o peso de um grande fardo.
Mais tarde, naquela mesma noite, Laura acordou subitamente com barulhos que vinham do apartamento vizinho. Os barulhos então tornaram-se gritos, mas esses ela não conseguia distinguir se eram de prazer ou de dor.
Vários dias se passaram e Laura desenvolveu uma certa curiosidade por seu vizinho misterioso. Ela percebera que ele passa a semana trancado no apartamento e sai somente às noites de fim de semana, e ela sempre consegue ouvir os mesmos gritos e barulhos quando ele retorna. Ao perguntar para os outros moradores do prédio sobre o rapaz, não conseguia nenhum tipo de informação, a não ser de que ele se chamava Eduardo, era uma pessoa bastante reservada e que se mudara há alguns anos, mas ninguém sabe de onde.
Uma noite, quando a curiosidade de Laura já havia se transformado em um interesse pulsional, ela decide seguir Eduardo pelas ruas chuvosas da cidade. Espreitando-o por entre as esquinas, ela chega em um bar um pouco lotado. Ao perceber uma espécie de palco montado, decide esperar e ver se Eduardo irá tocar. Duas cervejas depois, ele sobe com sua guitarra, senta num banco e começa a cantar. Ao final da primeira música, ele avista Laura. “Bom, acho que tenho uma fã presente aqui hoje. Essa é especialmente pra você.”, ele diz enquanto olha fixamente nos olhos dela. Agora seu olhar é ainda mais profundo do que aquela primeira vez, ele parece penetrar as órbitas oculares de Laura, vasculhar todos os seus medos e angústias até chegar no âmago de seu ser. Ele não desvia o olhar por um segundo e ela também não consegue. As notas, de uma psicodelia melancólica, que saem da guitarra de Eduardo hipnotizam a garotar e transportam sua mente para um lugar distante dali. Ao final da canção, Laura está completamente atônita.
O show se encerra, Eduardo aproxima-se da mesa de Laura, repousa a mão sobre a dela - ela sente a Pele dele fria, como se não corresse sangue por suas veias. Ele pergunta se ela não quer acompanhá-lo de volta ao prédio. Com uma voz distante, que não soa como a sua usual, Laura responde que sim.
“Sabe, há tempos eu venho lhe observando. Decidi fazer com você algo que há décadas eu não fazia mais... você pode ver isso como um presente. Pelo menos foi assim que me contaram.”, disse Eduardo quando os dois chegaram ao andar dos apartamentos. “Mas para isso, eu quero que você se sinta em casa. Porquê não me convida para entrar?”, ele completou. “Tudo bem”, respondeu Laura. Ela abre a porta e entra em seu aparatamento, “quer entrar?”, diz. Eduardo entra e fecha a porta atrás de si. “Vá para o quarto e tire a roupa. Não queremos nada rasgado, não é?”, ele diz. Laura obedece e começa a despir-se em frente à um espelho ao lado da cama. Seus movimentos são lentos, como se o corpo demorasse a reproduzir os sinais enviados pelo cérebro. Ela então sente a pele gelada de Eduardo encostar na sua. No espelho, porém, onde deveria estar o reflexo de Eduardo há um enorme vazio. Laura vira-se e se depara com uma criatura animalesca na sua frente, de feição completamente decrépita, uma pele sem vida alguma, os olhos de um predador que se delicia com uma presa pronta para o abate. Com o susto, ela desperta do estado de sono em que estava, no entanto só é capaz de dar um grito, que irrompe pela noite, misturando-se ao barulho da chuva. É tarde demais. A boca da criatura expande, revelando quatro presas gigantes, que saltam por entre a infinidade de dentes. O monstro ataca Laura mordendo-lhe o pescoço, atira-a na cama e se joga sobre ela para sugar toda a vida que há naquele corpo. Ele só para quando não há mais nenhuma gota de sangue correndo por entre as veias e artérias.
A criatura rola para o lado e aos poucos transforma-se novamente em “Eduardo”. O corpo de Laura permanece deitado, decrépito, sem vida e sem cor, quando de repente, seus olhos se abrem. Mas não são mais os mesmos olhos, eles não têm mais nenhuma vitalidade, encaram o nada com a mesma morbidez e profundidade que os de Eduardo.
Ao dar-se conta de sua situação, Laura chora um choro sem lágrimas, que a acompanhará, como um pranto silencioso, por toda a eternidade.
Por:
H.P. Hatecraft
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